quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Tocata

Ver-te com dedos
Palmas
Mãos
Verter-me então

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

O véio e o menino


E ocê vai ver, seu moço novo,
que a coisa mais triste do mundo,
quando a gente vai ficando
com mais primaveras vividas,
é que a gente perde
essa coisa tão boa
de se encantar
e que,
quando a gente, se encanta
mesmo depois de tantos encantos
é como se a gente quisesse ter
uma fome de vida
que num tem mais !
É gula!
Paixão, depois de um tempo, é gula de vida !

segunda-feira, 19 de novembro de 2012


Dá-me teu querer assombrado

desarma os botes

Fiquemos calados

Descança teu olhar trêmulo

em meu desejo ávido

Deixemos que caiam as folhas

atrasadas do outono passado

O tempo é ainda menino

correndo ansioso dos passos

Eu ouço a teu lado o apito

Acima dos trilhos sejamos alados

Dá-me tuas mãos ingênuas

para voarmos sobre as cidades

Vejamos juntos no horizonte marítimo

cada signo da linguagem

Deixa-me estar entre

o bemol e o sustenido

Do teu receio acalentado.


segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Busca

Quem conterá a nascente
dos vazios que me brotam
escondidos, escorrendo
pelas pedras medrosas
dos meus descaminhos

Quem iluminaria
minhas noites sombrias
com feixes reluzentes
de esperanças mesmo que vãs

Quem faria soar as cordas
ventar as saias
tocar a pele com a brisa
desaguar

Quem traria a calmaria
para ceiar em minha mesa
e se instalar como em vigília
ouvindo ternos acordes

Em que findaria a demanda
destas horas inférteis
de afeto devoluto
dos meus tacanhos dias

Quem me crucificaria
posto que morro e ressucito
pela redenção dos meus demônios





domingo, 4 de novembro de 2012

Fantasia

E como o mar em tempestade me alegro
no instante seguinte
calo

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Cantiga de Ninar


querido meu
sonho hoje que flutuaremos contentes
sobre o mar de saudades
até que elas findem sem dor.
depois nos amaremos em memória
e acordaremos repletos
por mantermo-nos de medos livre
por querermo-nos sem pudor

domingo, 9 de setembro de 2012

Luto


 
Nasce morto mais um amor
desabitando a terra de mais um sorriso
não acompanha nenhum cortejo
enquanto desce a ladeira a caixa lacrada
contendo os versos escritos
A despeito do luto,
a vida comum segue seu ritmo
Só a doce florista derrama uma lágrima seca
e no canto do olhar, de longe assiste
Depois se volta para as flores que expõe
enfeitando no largo, o chão de pedras antigas
           O que poderia ser
           se fosse o morto semente?
Do outro lado da montanha
ainda chora o céu da aurora
Aqui velamos os corpos ocos
para fugir da fome dos vivos

E nos fechamos em nossas calmas...
pelas frestas da alma nos despedimos

Nasce morto mais outro amor
morre muda a voz do meu grito


Precisão de amar

Vontade de barco é feita
De âncora
E de mar

Física do amor



Amor
Calor latente
Muda o estado da gente

Cansaço


Ando cansada de mim

cansada dos meus marejados olhos

da tristeza melancólica que envolve meus sonhos

Ando cansada da urgência

de que descende meus atrasos

e da estagnação que os gera

Ando cansada da falta de simplicidade

e das angústias em minha cozinha

e das cortinas da alma

Ando cansada das manhãs

e das noites curtas

e dos papeis grafados

e dos desejos abortados

Ando cansada

Mas sigo

Platonismo


Ele habita as minhas idéias

tem cheiro de juventude

o ideal

O corpo - Magro

moreno

A negra íris amplifica seu brilho pelos cílios alongados

Essencialmente contingente

airoso... alado

sua arte pedrês de linhas onduladas

pende das asas ansiosas

A rabugice é ancestral

seu pai é o mais velho de todos

Os cachos molduravam a boca sedenta

quando a imagem se grafava na minha pele

Pedi que me pintasse de carmim

doce, cedeu

O corte no tempo gentilmente transcorreu lento

e o frio do mundo se aqueceu no seu sopro

Não era um deus - era HOMEM

Não eram poderes, eram truques

Não creio de todo que ele existiu

Mas afirmo :

Hoje...



Ele habita as minhas idéias"


Cantiga


Ah saudade, sê gentil
encurta a distancia entre meu corpo febril
e o colo macio onde minh´alma descansa

Ah saudade, sê generosa
que se a falta é fome
eu tenho pressa
que a fome come
meu canto por dentro

ah saudade frutifica
transcreve em versos
a dor latente
faz das rimas o amor presente

ah saudade, por Deus, finda
que me falta o ar longe do leito
que o sol não basta
não me aquece direito
que eu já não suporto
essa dor no peito


Respeito


Respeitem meus poucos cabelos brancos

são neles que eu conto o tempo

Respeitem meu compasso ralentado

os meus dias não duram o mesmo que os teus

Respeitem a minha voz

ela é a única que me cala por dentro

Respeitem a marca do meu sorriso

e o desenho do meu choro

talhados no rosto antigo

Cada riso anunciou um grito

e cada lagrima germinou meu solo

 Respeitem meu mal-estar

sou prisioneira dele, não convidada

 Dês - respeitem meus versos

e me provem se há outro modo de vida

Carta de Recomendação


Bom, comecemos, desta vez, pelo principio

Façamos uma lista e tracemos paralelos

Quantos anos tem sua alma?

E por quanto tempo precisa morrer para se ressuscitar?

Não, não é inútil. É mister!

Qual o tamanho do pote? Em ouro ou mágoa?

E o tamanho da fome? De vida ou de desfiladeiro?

Há testamento?

Não. Não uso armas brancas. Só roupas

Sou filha da noite e nunca me calo

Tons bemóis ou pastéis?

Ah, claro! Cores... ? azul. Claro. Azul claro

Sim, mantenho lacunas

para que sejam preenchidas

Cartas? De recomendação, de despedida, de amores mortos?

As envia ou guarda?

Quantas são suas estradas?

E teus livros, lidos?

Toma, veste essas lentes:

Terra à vista?

Aporto. E enraízo

Bebe alguma coisa?

Parece que a noite não será tão curta quanto pretendíamos

Mas você não precisa ficar, se não quiser

Eu aceito um café, por favor.

Se pretende dizer algo, melhor agora.

É da ansiedade dos mortos a pressa dos vivos

Prefiro a loucura.

Sua lucidez é também solitária?

Casado? Filhos? Memórias? Medos?

Quantos?

Horas?

...

falta muito para amanhã

morreremos hoje, de certo
 
É, parece que não traçamos muitos pontos em comum
Talvez tenhamos nos enganado
Ou precipitado
Talvez seja melhor pegarmos carona separados
Ou em lados distintos da estrada
Quer que eu lhe arranje um mapa?
Posso anotar, no verso, meu endereço.
Minha memória é tão fraca...
Você pode desenhar seu rosto nesse papel?
Assim não esquecerei de todo.
Saudade é um tempo após a mágoa
Desejo é pressa no ventre da alma.
Se me lembrar, lhe enviarei pelo correio
Só as de alegria, certo?
Se é assim que prefere, talvez demore
Não tem tido a mesma fartura
nas colheitas de ultimamente
Sim, mas tudo vai muito bem,
contentamento é o que menos vende
e o comercio vem enriquecendo a família.
Emergentes pela procura do mercado!
Bom, fatalidades, que as pode conter?
de qualquer modo terá sido um prazer
depois que adormecermos.
Mande recomendações aos teus
diga-lhes que guardo afeto contíguo
E quando nos virmos novamente,
oxalá que não tão breve,
que não nos reconheçamos
para podermos, se for viável,
recomeçarmos o questionamento.

CARNAVAL




Desta vez não haverá luto

É carnaval

Em cinzas culmina Quarta feira

É carnaval

Minha doce mascarada

Despe-te

É carnaval!

Não haverá choro

senão o do bandolim

Não ouviremos guitarras em solo

seremos sós

Não haverá negro senão samba

É carnaval !

Descansemos bruxos

seremos todos feiticeiros

E reinaremos Momos

abrandaremos medos

Seremos livres

Não haverá luto

nem cartas

Não se darão despedidas

Não nascerão urgências

Calma

É carnaval

Desfilemos

contentes

Desfilemos

à parte

Deliremos

pois é chegado

o tempo da fantasia

É carnaval!

Manhã Morrida


Amanheci morta

Vejam vocês que triste contradição

Amanheci, sim,

Amanheci

A despeito pleno dos deveres

Amanheci

Em sol, em céu, em brisa

Amanheci

de tão sozinha, plena

de tão valente, medrosa

de tão disposta, inerte

de tão vaidosa, nua

de tanta coragem

Morta

Amanheci sem me despedir

E morta me levanto da cama

para um mundo de compromissos

E morta sobrevivo a mim

Morta destravo as porta

prendo os cabelos macios

E estou pronta para o dia.

Quando longe




Me fizeste covarde

Nessa fuga inconseqüente

Que me encontro



formas do silêncio alternadas

espaçadamente

mero insight insano



partiu meu solo

De onde um branco surgiu

Cortante



E quase perdi o medo

E quase me derramei em prece

E quase viva

De amor enfermo


Solidão de novo


De volta ao antigo percurso

as pedras amareladas no chão

datam a idade da estrada

Me despedi dele quando tomei o bonde,

me sentei na beira mas paguei a passagem.

O bonde ia no compasso choroso

e os sobrados começaram a retomar suas cores

cores de tempo

Houve que até o instante do adeus

as coisas eram de nuanças cinzas

como as pausas...

fluorescentes

e eram belas

e eram poesia

e eram tristes

e eram de alegria

Houve que o adeus

é nada mais que parte do caminho

e que eu o obedeço

Me dizes

Caminhe

e não saio ilesa da trilha

Nunca saio ilesa

porque se saísse

não estaria em movimento

Se sou, como de fato sou

Água de mar

Imensa

Nunca, de todo, estou estagnada

Houve que o suicídio

ainda era a opção mais sensata

no momento em que o bonde flutuava;

e eu flutuando acima dele

e outro ele aquém

e outros eus além

Houve simplesmente

que nossos caminhos

perdidos

não se cruzaram mais

Busquei ao redor -

sozinha -

Calcei asas

despi-me dos sapatos

e de alma nua

lancei-me à morte




 

Diário de Receitas


Peguei meu caderno de receitas

misturei com as páginas do meu diário

Estou tentando corrigir os erros

antes de cometê-los

Mas estagnado, o tempo passa corrido

eu atada aos antigos

poetas obscuros

que são o que eu sou,

e um fluxo histérico rio abaixo.

Procuro pelos lençóis

no leito vago

que se instaurou no ventre do meu peito

e sinto medo do coração infértil

e mais medo ainda do contrário.

Sem medidas

me calo

FOTO DE PERFIL


Chove fraco além das janelas

E miro imponente perfil

E me assombro

Quais criaturas surgirão hoje

Da inventiva memória?

Tudo que no silêncio se cria

tem certo gosto de medo escondido

em outros temperos

em outros saudosismos

Mas afago meu vazio

enquanto sonho

prevendo o último suspiro

Eis que me arrebata,

de seda branca,

a esperança

E a deusa me pega no colo

me cobre, sutil

e flutuante na chuva

me mantém quente

cantiga de amigo


Estou selando meu cavalo

Oh musa não chora

Reza em verso

Prenda minha

Que paixão não perdura

Vou aos campos de batalha

Você sabe, talvez não volte

Se voltar serei o homem

a quem olhas nesse instante?

Não princesa

Não prometo

Nem viver nem morrer por ti

Estarei inteiro ao seu lado

Até o instante em que partir

Levo comigo tua forma

Lapidada em meu desejo

E nas noites doídas de guerra

Lembrarei dos passeios de outrora

Que te entregavas a mim em beijos

Anseio não que me esqueças

Mas apenas que não me esperes

Guarda meu cheiro no baú de memórias

Em que guardas os teus segredos

E assim se o destino quiser

Princesa, deusa, ninfa

Nessa vida ou em outra

Te farei inteira minha





 
 


















Uma espécie de velhice


Primeira resposta:



Toda saudade é uma espécie de velhice,

como se o obedecer do amor não fosse sempre o contrário”



UMA ESPÉCIE DE VELHICE



Estou velho

e sou um homem cansado

Há tantas coisas que não posso entender

e que talvez as entenderia se tivesse a alma jovem

Mas sou um homem velho

e me sinto, de fato, cansado

Soube ontem o que me fez

perder a juventude em ímpeto,

como um lançar-se aos leões

inconseqüente,

Como se sobre a biga,

que horizontal corresse

enquanto dançassem ao lado fadas

e eu as olhasse, ignorando o precipício à frente,

como se o obedecer da trilha

não fosse o chão de pedras astrais,

e assim displicentemente

avante seguisse,

e em eterno instante

morresse voando...

como os pássaros

e continuasse vivo

como os velhos.

Me sento na varanda

no fim da tarde, com meu cigarro,

e descanso vazio

Uma trégua à loucura,

alimento à saudade,

feliz envelheço





Exílio


 Se você me viu por aí

bradando arrogante urro

não tome por real presunção

mas fora de mim são todos tão gigantes

que às vezes é preciso gritar para se fazer ouvir

para não se deixar pisar

Se você me viu por aí

correndo como os loucos em seus quartos

não tome por insano frenesi

mas sobreviver ao efêmero instante

desespera quem não se viu ainda

grafada numa subcamada

da pele do outro

recém tocada

Creia,

meu real veneno existe

só não há prontidão

nesses tempos de medo do escuro

de solidão cortante e dolorosa

pequenino


 
nas tardes em que as palmeiras voam

planam os olhos de minh´alma

buscando outra pessoa

Encontro


Um velho me pára na rua

fixa em meu olhar

como se invadisse meus sentimentos

depois

discorre sobre o preço dos remédios

e sai

no meio do argumento

andando e falando para o nada

Sigo também

olhar para baixo

vendo o desenho que as coxas fazem

sob o tecido da saia.

O velho sumiu

Deixando-me de herança

A solidão da angústia

inimigos rondam




em um céu egoísta

que escondera as estrelas,

em um abraço mesquinho

que privara o leito,

no instante do susto

vida e morte,

em turbilhão

se eternizam,

mesmo sem passado

ou futuro

O órfão moribundo

no mesmo instante do susto

fez meu corpo tremer em gozo

Quando as garras lhe escapam das mangas




Novos versos me surgem na noite úmida...

Onde estarão os transeuntes enquanto o chão se encharca?

Vê? Há um fio de delicadeza escorrendo em seus lábios...

Vê! Não se faça de malograda

Não venha gritar seus ruídos de fera!!!

Respeita meu ninho !

Nossos desesperos não são parentes.

Os olhos que visitam meu peito são cristalinos

Os seus me metem medo.

Aqui somos os mesmos quando cai a lua ou rompe o dia

Somos iguais aqui

mesmo mesquinhos, mesmo rançosos,

Mesmo humanos... com o orgulho de sê-lo.

Estamos em cio... de vida

De risos, e lágrimas claras de nascentes.

O que fez que lhes escapassem as garras?

Aponte-as a quem quiser.

Aqui somos os mesmos quando cai a lua ou rompe o dia

Somos jardim e cada pétala desse equilíbrio é muito sutil.

Vê... não é a primeira vez que lhe escapam as unhas ferinas

Te arrepende... reflete...



Senão em que pernas vais ronronar

quando acabar o pouco afeto que lhe cabe?

Estariam todas as pernas tão insanas

A ponto de esconder-se acima de teus pelos

E de tua curva coluna sem ensejo?

Mira teu norte à colheita

O plantio se dá em gentileza

E espera, que a tua pressa tem agora

Menos valia

Revolta


Abre essa porta e me encara

Anda!

Couraça pré-moldada

Sobe às alturas pra alcançar meu chão

Faz seus esgarranchos ocos

Primeiro doçura e orgasmos

Rimas batidas em neve por último

Espumas...

Receita do seu amor barato

Arquiteto de palavras

Não é poeta

Não é nada

Segue seus ídolos

Sádicos

Os três reis magos

Esmurra a tampa do pote de fel

E saliva

Quis me deixar culpada

Quer me enlouquecer

Pra que tanta dedicação à maldade

Se eu nem existo em você

Abre a porta desse peito

Em amor não há contrato desfeito

Meu tempo vai o seu te encontra

A vida ainda te cobra as contas

Diz o ditado e eu aguardo

Um dia é o da caça

Outro é do caçador

Se eu me perdi nesse enredo

É que eu tenho alma de poeta

Não de jogador

Fim de partida, é sua a vitória

Meu troféu é o desamparo

Tua sina é o desamor


Viagem de Volta


Velejei léguas e léguas

para ancorar no mesmo cais

do qual parti.

Faroleiro guia

invade luz no escuro mar do meu leito.

- Descer as velas...que não vento mais ao léu

Percorrendo o porto

calma

meus pés, meu corpo

reconhecem cada espaço

desse chão.

Clareia o dia

indiferente horizonte

Meus olhos não vêm fora


nada de mim

O ciclo da vida tem mais de uma rodada

O cais de partida é um

Outro é o porto de chegada

Manhã


Às vezes é preciso esperar amanhecer

para ver à luz do dia

que flores servem de alimento aos pássaros cantantes.

Às vezes é preciso dormir profundo

imerso em vazio

para descansar o pulso

do bombear corrido e sem compasso dos vagantes

Às vezes é preciso escolher o momento certo para despertar

Um delírio cortado ao meio pode teimar em eternidade

Mas, às vezes, quando a alma é delicada...

Às vezes, quando as cordas se corroem

E os nós não se atam

Aí é preciso AMANHECER-SE

Amante


Quero teu corpo moreno

Teu peito-colo

Teus pelos roçando a natureza dos meus

Quero teus cachos em minha nuca

Tuas mãos em minha cintura

E o eco doce do teu sussurro

Instigando mais meu desejo

Quero assim mesmo, sem compromisso, te revisitar com um sorriso

Dizendo vem...

Quero as tuas confusões se calando em beijos

Quero tua pressa e sutileza

Ver teu instinto saltar do olhar

Gosto do espetacular que envolve essa trama

Essa efemeridade bacante

Dos encontros furtivos em noites sempre curtas

E o gosto do teu lábio, e o cheiro de sua pele

E o peso de tua mão que me aperta

Por vezes transita meu corpo em memória

Por vezes se dá por esquecido

Pela minha janela




Desperta meu corpo pulsante

Enquanto lenta rompe a aurora

Singelo pássaro me observa

Inclina lateral

Seu bico ansioso

E me invade

Percorro o bosque fresco

Ao som dos murmúrios

E acordes de cordas

Galhos e folhas se abrem para passagem da luz

Sublime altar iluminado

O vento balança a cúpula das arvores

E as folhas secas deslizam em dó maior

Orquestra no meu peito

Em mim também acontecem coisas

Coisas de cores

Sentimentos sutis

Vencem vaidades

A vida é boa

Como o prazer dos cabelos movidos lentos

pela brisa através do rosto

tranqüila alegria sorri em mim

e vislumbro a crença na felicidade

Oco


O que poderia eu fazer

Nesses dias em que um oco me habita

Versos?

Fraquejam meus dedos trêmulos

Pena e tinta escorrem

Manchando a pauta versada

Falta-me o canto

Falha o ar no fole rouco

Sempre as mesmas palavras

Recorrem as ânsias

Pensamentos líquidos

A solidão ampara

Pequenas misérias cotidianas

Tudo é vão

Pairo intocável

Com um frio estridente

Arrogante mundo

A vida corre


Um verso contente


Minha vida tem sido a trajetória de incidentes que me cortam

que me sangram de prazer

Talvez possa dizer que meu olhar adorne os fatos

Não

Meus passos seguem a poesia... walking down the line

Surpresas amanhecem na porta da minha vila 

e me sorriem

Beijos meus roubados entre os transeuntes atônitos

enquanto flutuo circular segurando flores

Abençoadas tristeza e alegria

de sentir-se por inteiro

Amigos me encontram com cajados de peregrinos e saias de ventarolas

outros me fazem musicas

Todos em minha volta tem asas ou coroas de macela

e eu os posso pentear os cabelos

Longe do lar saudoso

onde minha viola ocupa o quarto

e minha falta presente - fica

Nesse infinito fluxo

caminho meus passos calmos

calçando sapatilhas de seda

brancas

como a alma dos anjos



Hoje


Hoje sinto a tranqüilidade

de quem  deita ao pé da arvore

num dia de sol quente

Hoje a cidade condescendente

flui na mesma sutileza

que a brisa toca meu rosto e levanta minha saia

Gesticulo com ternura

e me sinto posando para o retrato

meu peito paira

como a gaivota sobre o céu do lago

e caminho contente

como quem flutua




reencontro nos guardados a velha colcha de crochê por terminar

revejo as cores que havia escolhido em tempos idos

pensando que cores agora combinar?

não sei se termino ou se desmonto

se faço mil toquinhas de bebê

as partes de mim quando se encontram

não se servem mais

versos soltos... sem destino

nas noites insones sozinhas

colho cravos amarelos pra enfeitar o frio das montanhas

paradoxais sentimentos

a escrita inconsciente enquanto a idade pesa nas costas

"as raízes na marquise... eu tenho mais de vinte anos"

e a busca incessante

sem planos

plaino  vôo livre

qual queda

lagrima psicodélica

e a alegria do mundo me irrita

não me deixo ouvir as risadas alheias

fervo-as em puro rancor

me digo

qual o quê?

me pinto

estampado sorriso superficial

enquanto chora o ventre

enquanto sou mortal 

Melancolia


noites frias

esperançosos dias

a vida tem sempre melodia

no meio de montanhas cristalinas

um surto de alegria

e calmaria

 

mais que palavras

companheiros

sonhos próximos

verdadeiros

  

não há tristezas

há melancolia

e ela é bela

ela é a pura poesia

é preciso


preciso de silêncio

de flores e sambas

de choros e canções

de amores e paixões

preciso de tempo

de calma e acalanto

de mãos envolvendo meus ombros

preciso ser lida, ouvida, sentida

preciso ser querida

preciso de risos de criança

de colos conhecidos

de lagrimas alegres

e tenho tudo o que preciso

Silêncio


meu silencio habita o papel
grafando nele o que me corta
sou um peito vertendo sangue
sou um ventre que aborta
meu silencio é meu lamento
é meu choro, minha agonia
conheço o mundo real
e nele não há alegria
meu silencio existe às avessas
minha voz o explicita
há quem me enxergue fada
há quem me creia maldita
Meu silencio é minha navalha
abrindo os pulsos da vida
Meu silencio é minha morte
Minha eternidade sofrida

bamba


me encanta a corda bamba

mas não andar sobre ela

gosto do vento que bate no rosto

quando me atiro à queda

Caindo me penso voar

meu corpo sem ossos não quebra

abro os braços procuro o chão

a queda é livre e eterna

GRITO


há um grito mudo que percorre-me por dentro

por onde ele passa formiga meu sangue fervente

um pedido de socorro se dirige para dentro e fora

um lamento inútil

pranteando dissonantes vozes surdas

meus poros se comunicam

e os cantos de mim se acalantam

há um abraço vazio fazendo tocar

minhas mãos em minhas asas

uma réstia de delírio

um riso frenético

e um maldito grito mudo

a fora isso

corre o mundo


Vem Vida


Me faz querer mais poesia
Vem vida, me arrebata
me deixa na boca o gosto doce do sangue pulsante
Vem vida, desestrutura
Me faz dançar no salão vazio
envolvendo meu peito no seu silêncio
Vem vida, me come
engole as medidas,
as rimas chorosas
as tardes eternas
os limites, os acordes
Vem vida, vem sem despedidas
sem culpa, sem sorte
sem juras desditas
Vem vida...
vem ser minha morte

Cócegas


Fez cócegas em minhas costas

não percebi o que era de fato

um cheiro de Tulasi me bateu na cara

fiquei tonta

Retomada a consciência eu era mais leve

e maior, quase grande

espreguicei e percebi que fazia ventar

espreguicei de novo, e de novo

ventava mais

ate tirar meus pés do chão

Quando abri minhas asas brancas pela primeira vez

fez cócegas em minhas costas

e eu voei

insone


 

te faço mil versos... te digo?

não devo... converso

te quero? ... nem te conheço!

te ignoro... te imagino

ai poema que corre na veia

só mesmo em ti desperto

tristeza? quem dera...

isso tudo é o mau da espera